Colunista - Isabel Cristina Pereira Leite

Bebê Reborn: Entre o Lúdico e o Terapêutico – Um Alerta para os Limites Psicológicos da Realidade Substituída

Bebê Reborn: Entre o Lúdico e o Terapêutico – Um Alerta para os Limites Psicológicos da Realidade Substituída
  • Isabel Cristina Pereira Leite CRP11/22313

O fenômeno dos bebês reborn — bonecos hiper-realistas que imitam bebês humanos em detalhes impressionantes — tem ganhado notoriedade nos últimos tempos. Inicialmente comercializados como brinquedos de coleção ou artigos para artistas e entusiastas do realismo, esses bonecos ultrapassaram o universo lúdico dos colecionadores para adentrar espaços terapêuticos e, em alguns casos, ocupar papéis substitutivos de vínculos emocionais.

Muitas pessoas, independentemente de gênero, idade ou status social, em situações de luto, infertilidade ou solidão, encontram nos bebês reborn uma forma simbólica de conforto. Vale destacar que, quando utilizados com orientação profissional, podem, sim, servir como instrumentos terapêuticos válidos no enfrentamento de traumas, depressão ou perdas gestacionais. No entanto, o uso indiscriminado e sem acompanhamento pode levar à substituição ilusória da realidade, criando um vínculo que não promove a elaboração do sofrimento, mas, sim, sua cristalização.

Do ponto de vista psicológico, o apego excessivo ao bebê reborn pode indicar uma recusa inconsciente em lidar com a realidade, perpetuando estados de negação e reforçando mecanismos de fuga emocional. Há relatos de pessoas que passam a tratá-los como filhos reais: saem com os bonecos em carrinhos, trocam fraldas, simulam amamentações e organizam “chás de bebê”. Quando esse comportamento se torna cotidiano e inibe interações humanas reais ou o desenvolvimento de vínculos afetivos saudáveis, pode configurar um quadro preocupante.

Socialmente, o fenômeno provoca reações ambíguas. Enquanto alguns observam com curiosidade ou empatia, outros manifestam desconforto ou até mesmo críticas severas. Isso ocorre porque o bebê reborn expõe o limite tênue entre o afeto simbólico e a alienação emocional, com potencial rompimento com a realidade.

A psicologia alerta: toda ferramenta terapêutica exige critério. A fantasia, quando bem canalizada, tem valor reparador. Contudo, quando se transforma em refúgio permanente — fuga da realidade —, impede o crescimento emocional e a elaboração das perdas. Em vez de elaborar o luto ou a ausência, a pessoa corre o risco de se aprisionar em uma relação fictícia que, embora pareça oferecer acolhimento, reforça a solidão e pode ser aprisionadora, trazendo prejuízos tanto para a sociedade quanto para o indivíduo.

Recomendações importantes:

  1. Acompanhamento psicológico: é fundamental que o uso do bebê reborn, em contextos emocionais delicados, seja mediado por profissionais capacitados, como psicólogos ou terapeutas ocupacionais.

  2. Educação e conscientização: familiares e amigos devem ser orientados a acolher sem julgamento, mas também a identificar sinais de dependência emocional excessiva.

  3. Limites claros entre arte, terapia e realidade: é necessário enfatizar a função lúdica ou simbólica dos bonecos, sem confundir suas possibilidades com substituições definitivas da vida real.

  4. Incentivo ao vínculo humano: é essencial promover atividades que reforcem o convívio social, a construção de laços reais e a busca por apoio afetivo genuíno.

  5. O bebê reborn, como ferramenta terapêutica, pode ter papel relevante na vida de muitas pessoas. No entanto, como toda experiência simbólica intensa, requer limites, consciência e, principalmente, acompanhamento profissional adequado.

Em suma, o cuidado com a saúde mental precisa vir antes da imersão em realidades simuladas — por mais perfeitas que pareçam.

Isabel Cristina Pereira Leite CRP11/22313

Isabel Cristina Pereira Leite CRP11/22313

Bacharelada em psicologia pela Centro Universitário Dr. Leão Sampaio (Unileão) em 2023. Atuou como conselheira no Conselho municipal da pessoa com deficiência (COMDEF) e conselheira fiscal na Renais do Cariri